sábado, 15 de agosto de 2009

O namorado.

Tá, é isso.

Eu sou o namorado de Sophie Calle. Não, sério, eu sou. É engraçado, porque eu pretendo ver a exposição neste domingo, e de todas as contribuições que você pode participar no site, duvido muito que alguem tenha participado se colocando no lugar do namorado.

Quer dizer, eu estava no metrô, certo? E tinham essas garotas conversando sobre onde ir no fim de semana, daí uma vira pra outra e fala: 'Ah, tem essa exposição de uma mulher francesa que eu vi no Jornal, é sobre um cara que terminou com ela por carta' e a amiga dele: 'Por carta? Meu deus! Que cruel!' e aí elas continuaram a conversar sobre outras coisas para fazer no fim de semana, e eu sou o namorado de Sophie Calle. Apesar de você sabe, eu ser uma garota, e nunca ter namorado com a Sophie Calle. O e-mail é essa representação da carta hoje em dia certo? e eu teria entregado em carta se eu achasse que conseguiria aguentar ver o rosto dele ao receber a carta.

Entende, não é que eu simpatize com o namorado dela, eu tenho raiva dele como qualquer pessoa saudável teria mas eu também certamente não simpatizo com as garotas no metrô.

Na época eu achei que era a coisa certa a fazer, eu realmente achei que eu, sendo uma "escritora", conseguiria fazer que ele sofresse menos lendo que eu estava pisando no seu coração e ateando fogo nele do que se eu simplesmente falasse. Eu realmente achei. Ou talvez eu estivesse só me enganando, uma espécie de justificativa cuidadosamente elaborada enganar a mim mesma e não me fazer perceber que essa saída era mais fácil só pra uma pessoa. Agora eu vejo, além das minhas desculpas cuidadosamente elaboradas: eu cuidei apenas de mim. Fui covarde, covarde e covarde, porque, de algum modo, eu sabia o que vinha a seguir: a dor de partir um coração que me amava, doeu tanto magoa-lo que eu sei que continuarei a achar indefinidamente mais fácil ter o coração partido do que partir um coração até o dia de minha morte (talvez a morte seja pior, mas isso não me impediu de desejá-la durante alguns dias após isto).

Ele me perguntou: 'como você pôde me mandar isto por e-mail?', mas como eu poderia não mandar? É mais fácil dizer que você não ama mais do que escrever? As palavras ditas doem menos do que as lidas? Marcam menos no peito? Cuidam mais do interlocutor? Eu sou menos de um monstro por falar? Falar as mesmas coisas que escrevi, com a mesma intonação e com certeza a mesma intenção?

Eu sou o namorado de Sophie Calle, esse é meu ponto.

3 comentários:

Ana P. disse...

Então, eu fiz a mesma coisa com palavras ditas. E fui cruel, muito cruel. Não sei quão diferente seria se eu tivesse dito por email, mas olha, concordo com você, desse dia em diante eu decidi que seria a pessoa a eternamente levar um pé na bunda.

Talvez por causa disso ninguém queira, mas olha, pra mim melhor. Ou não, whatever.

disse...

A questão é: a coragem e o respeito de chegar na cara da pessoa e falar.

Lari disse...

Fê: sim, infelizmente eu só consegui pensar direito nos motivos depois. agora eu acho que o respeito seria o mais importante motivador pra não mandar o e-mail, mas eu não via isso claramente antes.

Ana P.: não que eu queira tomar um pé na bunda, mas é TÃO melhor do dar um pé na bunda, TÃO ME-LHOR. não consigo entender aquelas pessoas que querem sair por cima, entende? sair por baixo é o melhor jeito (considerando, é claro, que você goste minimamente da pessoa com que você tem o relacionamento moribundo)